É comum pensarmos em saúde como ausências: ausência de doenças, ausência de dores, ausência de contaminação etc. Essa noção se baseia em um padrão de existência e de ser humano limitado. Um modelo em que a natureza e a saúde são apenas mercadorias e que não considera as diversidades dos povos, suas histórias, modos de vida e compreensões de mundo. É diferente de quando consideramos saúde enquanto produção de vida, algo que se faz coletivamente, na relação com a terra, o território e a natureza. Saúde se faz na relação com os outros (humanos e não humanos), no cotidiano das trocas, no alimento sem veneno (sem agrotóxicos) e culturalmente diverso, na água limpa, no ar puro. Saúde é pertencimento, identidade e cultura.
Historicamente os povos indígenas vem garantindo a preservação da natureza, em toda sua diversidade, e resistindo ao processo de destruição ambiental desde o início da colonização, que se fez pela morte, expulsão e exploração desses povos. Negar o território é negar culturas, conhecimentos, modos de vida e vivências de espiritualidade que se dão na relação com a terra. É, portanto, violentar esses guardiões e ameaçar local e globalmente tudo aquilo que sustenta a vida e a saúde.
Existe um Projeto de Lei, o PL 490 (PL 2903 no Senado), que já foi aprovado na Câmara dos Deputados e que precisa ser barrado no Senado Federal. Esse PL afeta diretamente os direitos dos povos indígenas à vida, à saúde, à alimentação, à cultura, à educação, à moradia, ao lazer, à liberdade. Afetando esses povos, todos são afetados: nas florestas, nas águas, no campo, nas cidades. A vida do povo trabalhador vai ficar ainda mais sufocante, com as consequências das mudanças climáticas.
O PL 490/PL 2903 se baseia na teoria do marco temporal, que afirma que os povos só têm direito à demarcação de seus territórios se estavam ali em 1988. Ou seja, usa um parâmetro arbitrário, ignorando intencionalmente a presença indígena, suas culturas, suas línguas, suas ciências, suas origens e a história de suas lutas, bem como as violências, perseguições, expulsões de terras e confinamento sofridos pelos povos tradicionais na história do Brasil.
O PL abre os territórios indígenas para obras de grande impacto social e ambiental, como hidrelétricas, estradas, usinas eólicas, garimpo, mineração, sem precisar consultar as comunidades envolvidas ou a FUNAI. Além disso, flexibiliza o contato com povos isolados, proíbe a ampliação de terras já demarcadas e propõe que a União tome as terras indígenas em que, da perspectiva não-indígena, “tenha havido alterações dos traços culturais da comunidade”, negando aos povos o direito à história e à mudança
O PL foi aprovado em regime de urgência na Câmara dos Deputados (ou seja, sem passar por comissões e debates com a sociedade) e agora segue para votação no Senado Federal. Caso seja alterado, volta para a Câmara, e, se for aprovado, segue para sanção presidencial. Já a “tese do Marco Temporal” (Parecer 001/2017 da AGU) vai ser votada pelo Supremo Tribunal Federal no dia 7 de junho.
O PL 490/PL 2903 e o marco temporal são inconstitucionais e afrontam direitos fundamentais dos povos originários. Assim, compreendemos que é necessário e urgente a revogação imediata do Marco Temporal e da PL 490/PL 2903, e reivindicamos o direito originário previsto na Constituição Federal de 1988. A saber: Art. 231: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.” (CF 1988).
Precisamos nos mobilizar junto aos povos. É necessário o apoio de movimentos sociais e comunidades, instituições, organizações, órgãos internacionais e de todas as pessoas que são a favor da vida no planeta. Diversos desastres ambientais irreversíveis vêm acontecendo devido à exploração sem fim e sem freio pelos que dominam os poderes políticos e econômicos, destruindo todo tipo de vida de imediato. Precisamos da participação de todos que se importam com a vida na Terra.
03 de Junho de 2023
Assinam este documento:
PREMISCA – Programa de Residência Multiprofissional Integrada de Saúde Coletiva com Ênfase em Agroecologia (UPE – SES-PE)
Coletivo Pernambucano de Residentes em Saúde (CPRS)
RSMF – FCM UPE (Residência Multidisciplinar em Saúde da Familia – Faculdade de Ciências Médicas, Universidade de Pernambuco)
Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família do Campo – Garanhuns e Caruaru, UPE.
Residentes do segundo ano do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva – UPE/FCM
Núcleo Base Margarida Alves, do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família do Campo – Garanhuns.
Núcleo Base Gloria Maria, do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família do Campo – Caruaru.
CPT – Comissão Pastoral da Terra
ONG Thydêwá – Esperança da Terra
MIBA – Movimento Indígena da Bahia
Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável de Pernambuco (CONSEA-PE)
Rede de Sementes Crioulas do Agreste Meridional de Pernambuco (Rede SEMEAM)
Movimento Camponês Popular Pernambuco (MCP-PE)
Laboratório de Nutrição em Saúde Pública do Departamento de Nutrição – UFPE
Grupo de Pesquisa Psicologia e Ladinidades – Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília – UnB.
Agrofeira Territorial – Garanhuns
Rede Psicologia e Povos da Terra
Banquinha Libertária Cordel Antifascisfa
Coopanema – Cooperativa Mista dos Agricultores Familiares do Vale do Ipanema (Águas Belas-PE)
Organização dos Professores Indígenas de Novo Airão – OPINA
Grupo de Estudo, Sistematização e Metodologia em Agroecologia do Instituto Agronômico de Pernambuco – GEMA/IPA
Associação Quilombola de Castainho
Associação Guerreiras Quilombolas do Castainho
Pataxó T.I. Barra Velha
Observatório de Trauma Psicopolitico – USP/UNIFESP
Pulsares Saúde
AMIGP – Associação de Mulheres Indígenas Guerreiras Pankararu
Coletiva Eu Mais Velha
LACS/UPE – Laboratório de Ações Coletivas e Saúde.
Coletivo Riso da Terra
Guandu Grupo Agroecológico – Assentamento Carlos Marighella
Coletivo Semente das Águas Claras
Sociedade das Nascentes
Colibri da Mata
Cecília Goēy Suñé Novossat – Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Saúde Coletiva e Agroecologia (REMISCA – UPE) e Teia dos Povos
Júlia Ireno Di Flora – Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Saúde Coletiva e Agroecologia (REMISCA – UPE)
Lorena Correia Leal Rocha – Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Saúde Coletiva e Agroecologia (REMISCA – UPE)
Marcela de Fátima Lemos Tavares – Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Saúde Coletiva e Agroecologia (REMISCA – UPE)
Brenda Ramalho – Teia dos Povos
Rogério Malveira Barreto – Residente UERJ / Fundador Pulsares
Guilherme Alves de Siqueira – Programa de Residência Multiprofissional Integrada em Saúde Coletiva e Agroecologia (REMISCA – UPE)
Suely Emilia de Barros Santos – Professora da UPE – Campus Garanhuns
Juliana Catarine Barbosa da Silva/ Universidade de Pernambuco
Dani Eizirik – Sociedade das Nascentes
Silvia Bloise Mendonça – Instituto Libertas
Nathália F. M. Tenório
Amara Lígia Feijó de Melo-CRP PE 02/11226
Vique Feijó Canales
Grace Wanderley de Barros Correia
Thalita Analyane Bezerra de Albuquerque, mestranda em saúde e desenvolvimento socioambiental, UPE – Garanhuns/PE
Ana clara de figueiredo de Los reyes
Fykyá Pankararu
Sibelli de Carvalho Alves/Povo Puri
Tamikuã /Aldeia Indígena Pataxó
Sandla Barros
Adalberto Tavares
Maria José Lopes isidio
Eneida de Barros Santos
Poline Tenório Britto Galindo
Renata Pereira Farias/ Universidade de Pernambuco
Jullyane Chagas Barboza Brasilino – UPE Garanhuns
Bianca Sevciuc – Comissão de Saúde Teia dos Povos
Bianca Magalhães Sevciuc – Coletiva Eu Mais Velha
Jailton Bezerra Melo – Universidade Paulista (UNIP-SP)
Jucelino Mendes Barbosa – Quilombo Castainho
Ercilia clemente de Souza organização de professores indígenas, OPINA do Amazonas
Mariana Bernardes de Araújo – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Gleice Evangelista da Silva – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Polyana Rocha Oliveira – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Ingrid Araújo Ribeiro – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Dalaine Nogueira Silva – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Hortência Lopes Oliveira – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Lousanne Maia dos Santos – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Ayla Costa Gonçalves – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Isadora del Vecchio Neves Maizatto – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Jorge Isaías dos Santos – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Saene santos Silva – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Raiana Da Silva Coelho – Programa de Residência em Saúde da Família da Universidade Estadual de Santa Cruz/UESC-BA
Micaelle – UFRPE
Gabriel Bezerra Silva
Giselle Oliveira Santos, Universidade de Pernambuco
Maria Barbara de Oliveira – AMIGP/Mulheres/Pankararu/
Olga Torres de Oliveira Nascimento
Gustavo Barros Costa
João Victor Domingos dos Santos, Residente em Saúde Mental na Atenção Básica.
Álefe Passarin/Colibri da Mata
Paloma Costa/RMISF-UPE
Itamar Lages – coordenador do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde da Família do Campo – Garanhuns e Caruaru, UPE.
Thaianne Miranda Alves | Èmí Saúde Mental Ancestral
Marcela Caroline da Silva Moura/ REMISCA -UPE
Sandyelle Feitosa de Sena – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Giovanna Brenda Alves – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Isabella Leite de Carvalho – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Gian Wellington William Ribeiro dos Santos – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Larissa Nascimento Marques – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Maria Eduarda Oliveira Vilela – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Tiago de Souza Costa – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Marianne Feitoza Batalha – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Leila Gabriela Moura de Arruda – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Alanna Tays Piton Nogueira – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Maria Deisiane de Souza – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Luma Carolina Rocha Lemos – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Suellen Stephanie de Azevedo – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Maira Letícia Ferreira de Santana – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Jéssica Souza Santos – residente em Saúde da Família do Campo – UPE.
Amilson de Carvalho Gominho Filho, Psicologia UPE